Uma equipe brasileira busca juntar fundos para a produção do curta-metragem Ararat que conta a história fictícia de dois irmãos que planejam uma festa em rememoração ao centenário do Genocídio Armênio mas têm seus planos ameaçados por um turco que não quer que o evento seja realizado. Durante o dilema, são abordadas a história dos imgrantes armênios de São Paulo e de questões armênias.
O projeto tem roteiro e direção de Guto Gomes. Veja abaixo vídeo de apresentação e texto da campanha no Catarse:
https://www.youtube.com/watch?v=TF6taGvgiDg
A história
Ararat é uma sátira político-cultural com elementos de suspense e comédia. Pela obra, pretende-se discutir um tema pouco tocado no cenário audiovisual brasileiro: a cultura armênia no país (mais especificamente em São Paulo). A trama relata uma noite na vida de dois descendentes armênios, os irmãos Hagop (36) e Paulinho Pakunian (16), proprietários de uma tradicional confeitaria armênia, a Ararat Doces. A confeitaria é contratada para uma grande confraternização de lembrança dos 100 anos do genocídio armênio. Na véspera, os irmãos recebem um representante do evento.
O filme se passa quase que exclusivamente dentro da câmara fria da família, onde os irmãos encontram-se para tentar chegar a uma conclusão de um conflito. São motivados por visões muito diferentes sobre o recado dado pelo representante da festa e, consequentemente, sobre a sua própria cultura. O homem que irá visitar o local é descendente direto de turcos, e possui o claro objetivo de cancelar o evento e adiá-lo para uma data distante da correta. Para os personagens isso é um grande absurdo, da mesma forma que seria ilógico celebrar o Natal ou a Páscoa um mês depois do feriado. Uma data que já é tão dolorosa para descendentes armênios, possui o mesmo, ou até maior valor cultural.
Desta forma, a construção narrativa utiliza de alicerce a progressão de tensão e desconforto entre os personagens para chegar até o limite de duas culturas que ainda não se compreendem, nem muito menos se respeitam.
Por que fazer Ararat?
“Ocultar ou negar o mal é como permitir que uma ferida siga sangrando sem enfaixá-la”. Esta é uma fala de Papa Francisco em relação à forma como muitos países não reconhecem o genocídio armênio até os dias de hoje. Este tipo de ignorância em relação à história leva naturalmente a conflitos cíclicos não apenas em países como o Camboja, Ruanda, Bósnia, entre outros, mas principalmente entre a própria Armênia, Turquia e Azerbaijao, como tem sido noticiado nos últimos meses. A tragédia de 1915, que levou a vida de mais de 1,5 milhões de armênios pelas mãos do exército turco-otomano, permanece até hoje como um fato pouco discutido e reconhecido pelo Brasil e o mundo. Por ter sido mal digerido pela sociedade e história, este acontecimento mantém profundas mágoas e uma rivalidade brutal entre os descendentes destes dois povos, seja em terras brasileiras ou estrangeiras. A história armênia é forte, presente e deve ser contada e revisitada.
Com isto dito, Ararat é um filme sobre invisibilidade, cicatrizes e conflito de gerações. O principal objetivo do projeto é trazer à luz não apenas o tema do reconhecimento do genocídio armênio, como também sobre a própria existência e presença desta cultura no contexto brasileiro. Além disso, outro ponto importante do filme é o conflito de gerações. Enquanto Hagop, um homem maduro, criado em volta da cultura armênia, detentor de forte sotaque de responsabilidade quanto aos negócios da família, quer apenas “resolver logo” seus problemas, Paulinho representa uma força muito mais ativa e provocativa em relação à sua família e cultura. Ao mesmo tempo que Hagop é quem conduz o turco para dentro do local, é Paulinho que indigna-se e toma uma atitude em relação à situação. Sendo assim, visualizamos os acontecimentos sob o prisma de dois tipos de interpretação e gerações diferentes de uma mesma tradição.
A abordagem dos personagens em relação ao acontecimento passa por três camadas emocionais: a tensão/dúvida, a confusão e o clímax. Todo o caráter da “ameaça” por parte do descendente turco é inserida de forma extremamente passivo-agressiva em relação aos dois personagens armênios. Desta maneira, ocorre uma progressão muito sutil e desconfortável de sentimentos e reações de/entre Hagop e Paulinho, que agem e interpretam o tratamento do turco de formas diferentes. A ideia de que muitos povos, incluindo o armênio, possuem feridas mal cicatrizadas em suas raízes e percepções de mundo, machucados estes que muitas vezes são imperceptíveis, é um dos pontos principais de Ararat.