No sábado a tarde (26/10) enquanto eu assistia a excelente programação do Dia da Cultura Armênia na UGAB, durante sua brilhante apresentação, o amigo Norair Chahinian falou da necessidade de apoiarmos a comunidade armênia da Turquia. Ela é a ponta de lança na luta pelo reconhecimento do genocídio de 1915 por parte do estado turco.
Precisamente o dia 29 de outubro é a data de aniversário de 90 anos da República da Turquia, aparelho jurídico-político que encarna esse estado. São 90 anos do negacionismo mais sórdido e sujo que um governo pode sustentar. Negar sistematicamente o genocídio armênio maculou toda a história turca.
O negacionismo é uma herança carregada por todos os governos turcos desde 1923. A gênese está no fato de que o genocídio foi idealizado como segredo de estado e assim esse discurso oficial criminoso chegou até nossos dias.
Porém como qualquer ideologia, o discurso negacionista se fortalece de asserções que se alimentam de falsas premissas e de outras lógicas perversas, uma delas é a lógica da INDIFERENÇA.
O negacionismo se fortalece com a indiferença. Principalmente a nossa indiferença. Netos, bisnetos dos que ficaram órfãos de forma criminosa NÃO PODEM FICAR INDIFERENTES. A indiferença também é um negacionismo. A indiferença também é um genocídio.
Cada um dos meus leitores vai entender o meu conceito de indiferença de uma forma muito particular, tenho certeza disso.
O governo turco negacionista contesta a existência do genocídio como fato histórico. Por diversas vezes eles tem tentado legitimar a negação ou relativizar o crime, levando o tema para um campo de discussão supostamente acadêmico onde estudiosos turcos, imbecilizados pela opressão estatal, se apresentam como pesquisadores do assunto.
Eles chegam a pintar o genocídio como um mito, falácia armênia e certamente querem atender aos interesses da República da Turquia e sua agenda política xenófoba. E como isso continua até hoje?
As forças políticas, econômicas e estratégicas da Turquia explicam quase que por completo a manutenção desse discurso aberrante. Mas o outro ingrediente silencioso é a indiferença, e pior, muitas vezes a nossa indiferença perante um tema tão próximo de nós.
Eles comemoram os 90 anos da república usando ao longo da história dispositivos opressores, como o artigo 301 da constituição, que criminaliza toda pessoa que ofender ou afrontar o país ou o povo turco pode ser processada. Desde que essa lei foi implementada, em 2005, mais de 60 pessoas já foram incriminadas -inclusive o Nobel de literatura de 2006, Orhan Pamuk, hoje exilado nos EUA.
É esse artigo violento, execrável para qualquer país que queira ser chamado minimamente de descente, e que encobre o grande complô que tirou a vida do jornalista armênio de Istambul Hrant Dink, diretor do Diário Agos. Ele foi uma das vozes corajosas que denunciou o genocídio armênio. Nos últimos 20 anos mais de 30 jornalistas foram mortos na Turquia mostrando a face cruel do establishment turco, hoje representado pelas nefastas figuras de Ergogan e Gul.
Capturo uma outra figura de linguagem de um outro grande e querido amigo, companheiro de lutas políticas, Sarkis Kalaydjian. Em seu vigoroso discurso na rememoração da Expedição de Khanassor, organizada pelo Tashnagtsutiun (ACASP) meses atrás, ele lançou um questionamento: “se tantos já derramaram sangue pela nação armênia, o que nos impede de derramar uma gota de suor pela nossa causa e pela nossa gente?”
É disso que falo unindo as figuras de linguagem desses dois amigos. A lança só pode ser erguida com suor. Ela é pesada já que foi forjada para lutar contra um inimigo poderoso. Ao mesmo tempo a lança é leve, já que a única coisa que temos que fazer é contar para as novas gerações e não sermos indiferentes a uma causa tão justa e tão importante para o futuro da nação armênia. Se ficarmos indiferentes com a lança que está a nossa frente talvez o inimigo a roube e nos desfira um golpe ainda mais letal.
Aos 90 anos da república deles responderemos com mais 1.000 anos de lutas sem descanso se for preciso. Somos armênios e eles sabem disso!
****James Onnig Tamdjian é colunista do Estação Armênia e suas opiniões não refletem necessariamente às do portal.