A Folha de São Paulo de 26 de março traz um importante artigo na seção “Debates” do primeiro caderno assinado pelo advogado Simão Kerimian. O texto remonta a história do genocídio e alerta para esse crime bem como reclama de forma justa e mais uma vez exige a retratação do infeliz pronunciamento do Professor Bresser-Pereira no mesmo jornal no final de janeiro deste ano.
O CNA é a maior organização de defesa dos direitos armênios com filiais espalhadas por 30 grandes cidades do mundo. Seu trabalho está concentrado na luta pelo reconhecimento do genocídio de 1915 e na defesa da Armênia, Javakh e Karabagh.
O primeiro genocídio do século 20
A impunidade turca no genocídio armênio ajudou Hitler a justificar o Holocausto: “Quem lembra dos armênios?”, disse ele; a Turquia segue sem reconhecer seu crime
Ao aproximarmos do mês de abril, a lembrança nos remete ao fatídico 24 de abril de 1915, consagrado como o dia de luto nacional para o povo armênio e seus descendentes. Essa é uma data tarjada com o sangue de 1,5 milhão de armênios chacinados pelos turcos-otomanos de então.
É preciso rememorar a perda irreparável dos mártires armênios, que representou essa hecatombe inenarrável da tragédia do genocídio de 1915, o primeiro do século 20.
Os armênios foram forçados a abandonar seus lares diante da violência desumana e bárbara, executava com requintes de crueldade inimagináveis pela mente humana por ordens do governo turco-otomano.
O povo armênio, cujas raízes se estendem pelo mundo, disperso pela emigração a que fora obrigado, acabou em uma diáspora sem rumo e sem destino, ancorando nos portos dos países dispostos a acolhê-lo.
Esse genocídio, ainda impune, serviu de incentivo para que Hitler, de triste memória, ao invadir a Polônia, “justificasse” o holocausto judeu. “Quem se lembra dos massacres dos armênios?”, disse ele, em uma clara referência à impunidade dos genocidas turcos.
A atual Turquia, que deveria se redimir do crime praticado por seus antepassados, tenta falsear a verdade histórica fartamente comprovada. A Turquia é devedora do reconhecimento desse crime como reparação moral perante o mundo civilizado.
Entre os que testemunharam esse genocídio, estão abalizados diplomatas estrangeiros como o americano Henry Morgenthau, então na Turquia: “O turco julgava ter o direito de experimentar o fio de sua espada no pescoço de qualquer cristão. Os fatos ultrapassam as crueldade mais diabólicas nunca imaginadas na história do mundo”.
Morgenthau escreveu ainda que “as autoridades turcas deram uma sentença de morte para uma raça inteira. Eles entenderam isso bem e, em suas conversas comigo, não fizeram nenhuma tentativa particular de esconder o fato”.
Visconde James Bryce, da Câmara dos Lordes do Reino Unido, também escreveu sobre o assunto. “Não se registra outro fato na história, desde os tempos de Tamerlão, de crimes tão horrendos”. Arnold Toynbee, proeminente historiador britânico, e Winston Churchill, foram outros que escreveram sobre o genocídio.
Para Churchill, “não há dúvidas de que este crime foi planejado e executado por razões políticas. A oportunidade apresentou-se para eliminar do solo turco uma raça cristã”.
No Brasil, entre 70 mil e 100 mil armênios e seus descendentes, concentrados mais no Estado de São Paulo, aguardam o reconhecimento do genocídio pelo Brasil, a exemplo de Uruguai, Argentina, Rússia, França, Suécia, Vaticano, Itália, Alemanha, Venezuela, Chile e vários outros países.
A União Europeia inclusive condiciona a entrada da Turquia como membro ao reconhecimento do genocídio por ela.
Na França, o Parlamento aprovou uma lei criminalizando a negação do genocídio armênio, que foi recentemente considerada inconstitucional pela Justiça do país.
Esse tema foi abordado neste jornal pelo professor Luiz Carlos Bresser-Pereira (“A boa consciência da França”, em 30 de janeiro), expressando a sua infeliz opinião equivocada, que ofendeu a memória armênia ao fazer ilações irreais a favor do negacionismo.
Ele deve uma retratação perante a opinião pública do país e, em especial, perante a comunidade armênia.
SIMÃO KERIMIAN, 69, advogado e jornalista, representa o Conselho Nacional Armênio no Brasil
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