Por Tim Arango, do The New York Times, via Folha de São Paulo
O homem atacou ao anoitecer. Ele estrangulou a idosa, a espancou e a deixou desacordada. Fugiu com 50 liras turcas (cerca de US$ 30) e a aliança de noivado dela, a última recordação que a vítima tinha de seu marido, morto há muito tempo.
“Ele me batia sem parar”, contou Turfanda Asik, 88, que passou duas semanas numa unidade de terapia intensiva. “Bateu nas minhas costas. O que eu fiz a ele? O que ele queria?”
A idosa ficou machucada e perdeu a visão de um olho.
Acredita-se que seu caso tenha sido o primeiro de uma série de agressões cometidas nos últimos meses a idosas armênias em Samatya, o bairro armênio histórico de Istambul. Até pouco tempo atrás, os moradores do bairro não trancavam suas portas.
Apesar da brutalidade da agressão que sofreu, Asik teve sorte. Uma das outras vítimas morreu dos ferimentos recebidos.
Nas ruas tortuosas de Samatya -onde um sultão conquistador reassentou cristãos armênios depois de capturar Constantinopla, em 1453-, com seus clubes sociais, igrejas e salões de chá, os ataques estão criando um clima de insegurança. O medo deve-se a episódios passados de repressão que, segundo moradores, diminuíram nos últimos anos, à medida que a Turquia foi ficando mais receptiva às suas minorias.
No passado, os armênios e outras minorias foram amplamente discriminados na Turquia moderna, sujeitos a ataques violentos de nacionalistas e impedidos de exercer as profissões de prestígio, como o oficialato do Exército.
A situação melhorou nos últimos anos graças às reformas decorrentes dos esforços para ingressar na União Europeia, um processo que recentemente se paralisou.
Quando um suspeito dos ataques foi preso, pouco tempo atrás, um doente mental de origem armênia -não um turco fanático motivado pelo ódio, como muitos presumiam-, o fato só acirrou as suspeitas dos moradores de Samatya, para quem a polícia teria apenas encontrado um bode expiatório conveniente.
Independentemente de quem possa ser o responsável pelas agressões, a violência trouxe o passado doloroso de volta às mentes, apontando também para possíveis tensões futuras no momento em que o país se prepara para enfrentar o centésimo aniversário do genocídio de sua população armênia, nos últimos anos do Império Otomano.
Embora ainda faltem dois anos para a data histórica, em 2015, o país já questiona o tratamento que será dado ao aniversário: uma oportunidade de reconciliação e reconhecimento pleno dos massacres cometidos pelo Exército otomano ou a ocasião para mais tensão e discursos de ódio, como os que apareceram nas redes sociais após os ataques recentes?
O motorista de táxi muçulmano Sedat Caliskan, 35, vive a três casas de distância da mulher assassinada. “Durante anos, não aconteceu nada como isso”, comentou. “Quero acreditar que foram incidentes isolados.”
Colaborou Sebnem Arsu –
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