Por Anna Ghazaryan, via News.am
O site de notícias NEWS.am está fazendo uma série de entrevistas com diplomatas que trabalham na Armênia. A entrevistada da vez foi a embaixadora do Brasil na Armênia, Marcela Maria Nicodemos, que disse sobre as dificuldades da carreira diplomática, sua vida na Armênia e seu prato brasileiro favorito.
O seu dia-a-dia no trabalho difere de país para país?
Claro, pois você tem diferentes relacionamentos com o governo local. O relacionamento pode ser igualmente bom em diferentes países mas os projetos que você conduz e o jeito que o povo local reage às propostas é diferente. Por exemplo, nós tivemos um monte de atividades culturais aqui que ajudaram o povo armênio a conhecem a cultura brasileira. É uma embaixada nova; foi aberta em 2006, há muito mais coisas a serem feitas. Assim, nós temos que estabelecer prioridades, diferentemente de países que tem uma longa história de relações com o Brasil. O relacionamento entre os Estados e como um casamento: no início, quando você se casa, tudo é fácil, mas com o tempo as coisas começam a ficar complicadas. Você conhece a pessoa melhor e ela te conhece , mas você deve agir com mais cuidado para não se meter em problemas.
Qual você acha que é a ferramenta diplomática mais forte?
É a capacidade de se relacionar bem com outras pessoas e aceitar as diferenças que qualquer diplomata e qualquer pessoa pode encontrar em seu próprio país e em outro Estado. Ele deve compreender essas diferenças. É uma forma de enriquecimento pessoal, trabalhar junto com pessoas e com o governo do país onde ele ou ela está vivendo. Isso pode ser enriquecedor para ambos os países. Se você não aceita isso, se você não tem tolerância com a cultura estrangeira, você não poderá ser um diplomata de modo algum.
Quais são as vantagens e as desvantagens do seu trabalho?
A vantagem é uma oportunidade de viajar, conhecer pessoas novas, viver diariamente com pessoas de diferentes culturas. Não é a mesma coisa se você viaja como turista. Como turista, você vai ver as boas coisas, mas não as dificuldades que qualquer país enfrenta no dia a dia. Uma desvantagem é que algumas vezes você tem a barreira da língua. Há sempre uma forma de se comunicar mas algumas vezes é mais difícil. Vir do outro lado do mundo e falar uma língua latina, totalmente diferente do alfabeto armênio, cria certa dificuldade. Mas não é algo que você não consiga superar. Eu me arrependo do fato de não ter decidido levar a sério o estudo da língua. Eu só sei “mi kitch” (um pouco), “shnorakalautyun” (obrigado), “barev dzez” (oi), “inchpesek” (como vai você), “kamac-kamac”(devagar). O alfabeto armênio é muito difícil.
Ainda há mais homens na política e na diplomacia. Você acha que esse trabalho é mais difícil para uma mulher? É fácil se comunicar com os funcionários, na maioria, homens?
No mundo todo aceitamos que uma mulher tem a mesma capacidade do que um homem. Mas ainda é uma das principais dificuldades para uma mulher entrar na carreira diplomática e atingir o posto mais alto, combinando sua vida pessoal e profissional. Se você quer casar e ter filhos, você deve ter um marido compreensivo, que eu tenho a sorte de ter, e deve estar apto a dividir seu tempo entre a família e o trabalho, sem machucar nem um nem outro. Eu sou uma pessoa de muita sorte nesse sentido, meu marido e meu filho sempre me acompanharam. As mulheres estão começando a serem profissionais em todas as áreas. Nós fomos um dos primeiros países, ao menos na América Latina, a ter uma mulher presidenta, mas ainda há um longo caminho a percorrer.
Quando falamos em Brasil, imaginamos praias, Rio de Janeiro, carnaval, café e futebol. Como você imaginava a Armênia antes de chegar aqui? Onde estão os estereótipos?
Para ser sincera, eu não tinha nenhum estereotipo. A primeira coisa que me passou pela cabeça foram meus colegas diplomatas de origem armênia. Mas eu não tinha muita ideia sobre o país. Eu comecei estudando a história. Nós temos que ser confirmados pelo parlamento brasileiro antes de ir para um país novo, então eu estudei muito. Eu fiquei realmente surpresa com a grande cultura e história de vocês, e todos os seus progressos ao longo dos anos.
Qual seria o seu conselho para o seu sucessor? Você alertaria ele ou ela sobre algo na Armênia, talvez sobre o clima?
Não, eu tinha trabalhado no Canadá antes de vir para cá. Era – 25º C, terrível. Eu diria ao meu sucessor que é um país onde é muito fácil se relacionar com outras pessoas. Vocês são muito generosos. Eu sempre achei isso impressionante: você pode visitar um armênio só para dizer “oi, tudo bem?” e ele vai te fazer sentar e te oferecer um café e um monte de comida. É algo que você não vê em muitos países. No Brasil, as pessoas podem te perguntar “você aceita um copo de café?” mas não vão muito além disso.
Eu diria a ele que nós não temos problemas nas relações diplomáticas com a Armênia, que tem muitas coisas para ver no país e que é um lugar seguro.
Há algo que você sinta falta estando fora do Brasil?
Meu marido me disse algo uma vez que eu percebi que era verdade – a última coisa que você abandona de seu país de origem é a comida. Algumas vezes eu quero comer, por exemplo, pão de queijo. A primeira coisa que eu faço quando chego no Brasil e é ir em um café no aeroporto comer um pão de queijo. De vez em quando eu sinto falta do idioma. Eu passo 90% do meu tempo falando inglês, espanhol ou francês. As vezes eu sinto falta de falar português.