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15/03/1921 – Mandante do Genocídio Armênio, Talaat Pasha era assassinado em Berlim

Talaat Pasha (Mehmet Talaat) era o Ministro do interior do Império Otomano e um dos três oficiais que dirigiam os Jovens Turcos (Comitê União e Progresso) nos últimos dias do império. Ao lado Enver Pasha (Ministro da Guerra) e de Djemal Pasha (Comandante das forças armadas) , Talaat era o principal organizador do Genocídio Armênio.

Talaat fugiu para Berlim assim que Aliados venceram na Primeira Guerra Mundial. Os tribunais militares que aconteceram no território ocupado de Constantinopla (atual Istambul), nos anos 1919 e 1920 condenaram-no e outros grandes oficiais à morte à revelia por seus papéis nos crimes horríveis cometidos, em particular contra os armênios e outros cristãos otomanos (saiba mais aqui).

Os julgamentos de Constantinopla contra os executores dos massacres começaram somente em 1919. Mais de 100 altos funcionários do governo dos Jovens Turcos estavam presos. Os julgamentos eram diferentes para cada um deles em função de sua influência e de seu poder. Tevfik Bey, por exemplo, comandante das deportações dos armênios em Yozgat, foi condenado a 15 anos de prisão e trabalhos forçados.

Mas, incrivelmente, os julgamentos também impuseram pesadas penas a Talaat e Enver, que foram condenados à morte. Nesse meio tempo, eles já haviam fugido. Aí está uma das farsas dos julgamentos de Constantinopla entre 1918 e 1919.  Assim, os maiores responsáveis pelo genocídio dos armênio não tiveram suas penas executadas por esses tribunais. Pouco depois, o movimento revolucionário liderado por Mustafa Kemal Atatturk atravessou o processo. As potências ocidentais posteriormente fizeram seus próprios acordos com o novo governo turco, agora sediado em Ankara, não mais em Istambul.

Com um poder cada vez mais consolidado em territórios do decadente Império Otomano, a Inglaterra foi perdendo interesse nos julgamentos. O governo britânico conseguiu a custódia de quase 70 prisioneiros turcos e os transferiu para Malta, ilha ocupada pelos ingleses no Mar Mediterrâneo. Com a “posse” de muitos dos assassinos dos armênios, os ingleses aplicaram a eles o rito jurídico do Reino Unido: não haveria mais pena de morte. Eis uma outra farsa dos julgamentos de Constantinopla  entre 1918 e 1919.

Foi o genocídio armênio e a farsa dos julgamentos que alertaram muitos juristas da necessidade de se pensar um tribunal internacional para crimes contra a humanidade. Foram as injustiças contra os armênios e a falência dos processos contra os Jovens Turcos que abriu as portas para os julgamentos dos Nazistas em Nuremberg, entre 1945 e 1946.

A forma de condução desses julgamentos teve ainda um significado maior. Kemal Ataturk levantou os nacionalistas e assumiu o poder. Suas tropas enfrentaram franceses e ingleses e num desses combates Ataturk aprisionou 30 oficiais britânicos e exigiu a libertação de todos os turcos presos em Malta. Eis aqui a prova de que o governo da República Turca é o herdeiro e responsável por tudo aquilo que fez o Império Otomano. Eis aqui mais uma farsa do direito internacional naquele período. Executores do genocídio presos foram libertados em troca de oficiais ingleses, reféns dos turcos.

Os armênios, no entanto, não permitiram que esses vereditos caíssem no esquecimento. Foi essa incapacidade do mundo de punir criminalmente os mandantes do genocídio armênio que impulsionou o Tashnagtsutiun a realizar a Operação Nêmesis que orquestrou a perseguição e assassinato de uma série de altos oficiais fundamentais na realização do Genocídio Armênio (veja a lista aqui).

O Nono Congresso da Federação Revolucionária Armênia (Tashnagtsutiun) tomou a decisão de rastrear e executar os culpados pela tragédia que se abateu sobre o povo armênio somente depois de avaliar toda essa situação.

Provavelmente o maior dos assassinatos da Operação Nemesis – certamente o mais sensacional – foi o de Talaat Pasha, que foi morto em plena luz do dia em Berlim, em 15 de marco de 1921. O jovem Soghomon Tehlirian foi o escolhido para puxar o gatilho.

Como muitos de seus compatriotas armênios, ele havia testemunhado os horrores de 1915, assistindo sua família massacrada diante de seus olhos e sendo deixado para morrer. Sobreviveu e ingressou nas fileiras da Federação Revolucionária Armênia. Tehlirian ganhou alguma experiência de combate e treinamento antes de ser envolvido nos planos de assassinato encobertos. Ele chegou na Alemanha, se alojou perto de onde Talaat Pasha residia em Berlim e, depois de algumas investigações, cumpriu a sua missão.

Parte do objetivo era ser pego, para ter um julgamento, e gerar uma cobertura que repercutisse na Europa. O caso todo foi um grande evento para a época, não apenas porque ele trouxe à tona a realidade do Genocídio Armênio que era lentamente deixada de lado – em particular na própria Alemanha, onde a notícia de tais massacres em um país aliado não foi espalhada livremente durante a guerra – mas porque, no final, Soghomon Tehlirian foi absolvido por seu crime.

Não houve negação, não há dúvida de quem matou quem e como. Mas, depois de ter sido exposta toda a história – a transcrição foi executada por páginas e páginas, detalhando experiências horríveis de Tehlirian e estado mental mais tarde – o júri achou melhor libertar Tehlirian. Desnecessário dizer que o caso causou um imenso clamor e forneceu um forte sentimento de vingança para os armênios já dispersos por todo o mundo.

O julgamento virou um best-seller intitulado “Um Genocídio em Julgamento – O Processo Talaat Paxá na República de Weimar” e muitas pessoas ouviram sobre os horrores do Genocídio Armênio por sua causa.

Recentemente, o renomado ator americano Eric Bogosian também escreveu um livro sobre Soghomon Tehlirian (veja aqui).

Soghomon Tehlirian mais tarde viveu na Sérvia, antes de finalmente mudar para a Califórnia, onde morreu em 1960. Ele foi enterrado em Fresno, no Cemitério Ararat, debaixo de um obelisco tampado por uma águia com as asas estendidas atacando uma cobra.

Os restos mortais de Talaat Pasha foram transferidos da Alemanha nazista para Istambul em 1943, enterrado com todas as honras em um monumento nacional, que ainda está de pé.

 

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